sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Ciclo.

Na sarjeta de sua cela, ele sentiu o sol nascer. Um minusculo furo na parede era como o seu sol particular. Deitava, a noite, bem de frente para o buraco, a fim de sentir a luz do sol nascer em seus olhos, pela manhã. Já era de costume acordar dessa forma, afinal, enclausurado como estava, de que outra forma poderia se levantar e perceber que o dia passava?

Sentiu o chão tremer levemente. Passos. Fingiu que dormia, pois não queria conversa. Como sempre. Sentiu os passos diminuírem até pararem, finalmente, em frente a sua cela. Podia ouvir a respiração agitada da pessoa. Escutou um barulho metálico, e pensou em um molho de chaves, confirmando seu pensamento quando o desconhecido enfiou a chave na porta, girou-a e abriu a porta.

- Daniel? Acorde agora, por favor. Precisamos de você.

"Precisamos de você"? Ele ouviu certo? Alguém no mundo precisava dele? A curiosidade venceu o cansaço e ele acordou falsamente.

- Quem?

- Você sabe quem.

Logo lhe veio a mente a única pessoa que poderia precisar de sua ajuda. Juntou todas as forças que ainda possuía em seus ossos gastos e em seus músculos flácidos e levantou, cambaleante.

- O que houve?

- Venha comigo.

Seguiu o desconhecido pelo corredor. Passaram pela porta que leva a cela, e então seguirem por um longo corredor, acompanhando as luzes no teto. Viraram a direita, e subiram as escadas. No final da escadaria, havia uma porta, que estava aberta. Saindo da mesma, encontravam-se de frente para uma casa enorme, pela parte de trás.

- Tinha até me esquecido de como era esse lugar.

Seguiram pela porta dos fundos, saindo em um salão com uma escada logo a frente. Ao subirem a escada, depararam-se com uma porta grande, aberta mais uma vez pelo desconhecido. Ao entrarem, tomou um susto.

Não conseguiu reconhecer quem estava na cama. Branca, fraca, havia perdido o brilho nos olhos. O cabelo havia descolorido. Os lábios estavam brancos. Ironicamente, sentiu o coração na boca.

- Ela precisa da sua ajuda agora.

Dirigiu ao lado da cama, e então, tocou em seu rosto.

- Claro. Volto logo.

Após encostar em sua branca e gelada mão, sumiu. Quer dizer, sumiu do quarto. Reapareceu em um inferno. Não necessariamente O inferno, mas em um lugar escuro e assustadoramente frio. E então, começou a sua busca.

Após caminhar e praticamente definhar pela escuridão, avistou uma fraca luz. Correu em direção a mesma. O brilho, cada vez mais intenso, tomava a forma que ele tanto conhecia, por tanto tempo. O cabelo, os olhos, o corpo, a beleza estonteante. Ali sim. Era ali que ela estava. E só ele, por ser quem ele era, poderia salvá-la.

Chegou a um palmo de distância, já não conseguindo mais esperar para tirá-la de lá. Porém, assim que encostou em seu corpo, foi empurrado com uma força sobre-humana para longe.

Até que não podia mais ver o brilho.

Quando acordou, estava caído no quarto aonde a cópia pálida da mulher perfeita estava deitada. Mas ela não estava mais lá. A cama era ocupada por outra figura. O quarto, inclusive, estava escuro. Sombrio. Apenas com a luz do luar incidindo pela janela, quem nem havia reparado existir quando esteve lá de manhã. Levantou-se, e olhou para a cama.

Não entendeu. Estava vendo a si mesmo. Pálido. Sem brilho nos olhos. Cabelo descolorido. Lábios roxos. Sem vida.

- Não deu certo. Vamos de novo.

Antes de poder virar e olhar nos olhos de quem falou isso, desmaiou com uma pancada na cabeça.

E no dia seguinte, a sarjeta de sua cela, ele sentiu o sol nascer. Um minusculo furo na parede era como o seu sol particular. Deitava, a noite, bem de frente para o buraco, a fim de sentir a luz do sol nascer em seus olhos, pela manhã.

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