quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O último sopro - Capítulo Final

- Pra onde vocês estão nos levando, seus desgraçados? - Disse Jensen, nervoso e segurando na mão de sua irmã.

- Você logo vai descobrir - Disse Francesco.

O carro se movia rapidamente. Jensen e Mary estavam no banco de trás, Mary na ponta e Jensen no meio. Do outro lado, estava Francesco, com uma arma apontada para a cabeça de Jensen. Um dos capangas do ditador dirigia o carro, e era seguido pelo jipe com os outros dois. Bill estava no banco do passageiro.

- Como pode, Bill, como pode? - Disse Jensen.

- Negócios, Jensen, apenas negócios.

- Como, negócios? O que nós fizemos? Por favor, me levem, mas deixem a minha irmã!

- Temo que não posso. Ela é linda, juro, me dói o coração fazer isso. Mas o preço é por vocês dois.

- Que preço? Que MALDITO preço?

- Aproveite a viagem, Jensen. Cale essa boca e apenas aproveite a viagem.

- Não v...

Francesco deu-lhe um soco na barriga, tirando-lhe o ar. Jensen travou e tentou se recompor. Mary chorava. Foi o suficiente para que eles ficassem calados o resto do trajeto.

Jensen percebia algumas coisas que o fazia tentar imaginar aonde estava. Escutava algum movimento, logo não estavam indo para algum lugar deserto. De vez em quando, o carro parava, como se estivesse trafego intenso ou como se estivesse parando num sinal. Pensava em pedir ajuda, mas o carro era vidro fumê. Ninguem podia ver as duas pessoas com sacos pretos cobrindo o rosto. Era uma esperança inútil. De repente, o carro fez uma curva brusca para a direita e parou. Um porta se abriu. Alguem saiu do carro. Ele não sabia se era Bill ou o outro ex-militar. Ele escutou um portão de grade se abrindo. A pessoa que saiu voltou para o carro, fechou a porta, e voltou ao movimento. O carro entrou dentro do lugar desconhecido, desceu, como se estivesse indo para algum tipo de garagem, e Jensen sentiu as luzes do ambiente diminuírem. Estavam em algum lugar escuro.

O carro parou. Bill e o ex-militar motorista saíram do carro. Francesco também, puxando Jensen junto com ele.

- Vambora, moleque!

O outro ex-militar abriu a porta de Mary e a puxou.

- Não a machuque, desgraçado!

Outro soco na boca do estômago, e Mary continuava chorando. Francesco e o outro ex-militar levaram os dois irmãos para dentro do lugar escuro, que Jensen ainda imaginava ser um garagem. Desceram um lance de escadas, e alguém abriu um portão, provavelmente Bill. Os irmãos foram jogados para dentro desse lugar. De repente, alguém tirou o saco da cara de Jensen.

- Maldito!

Jensen tentou avançar sobre Bill, mas esse foi mais rapido: sacou sua arma, uma colt. 45, e deu um tiro que passou rente a orelha de Jensen. A precisão e rapidez daquele cara foram incríveis. Recuou o suficiente para sacar sua arma numa velocidade impressionante e atirar perto o suficiente para assustar mas não para acertá-lo. Jensen caiu atônito no chão.

- Maninho! Maninho! MANINHO!

Aquele era o terceiro tiro que Mary havia escutado, ou melhor, presenciado, e o terceiro que havia lhe feito chorar. Jensen estava ofegante no chão. Olhou para a sua irmã, ainda com o saco no rosto, e parou.

- Calma... Estou aqui. - Disse Jensen,

Estava péssimo por fazer sua irmã passar por isso. Mas não era culpa dele, afinal.

- Tudo bem. Vem aqui, vou tirar esse saco do seu rosto. - Continuou.

Ao tirá-lo, Jensen viu o rosto de Maryanne vermelho, coberto por lágrimas. Deu-lhe um abraço, e lhe disse que tudo ia ficar bem.

- Isso já vai acabar. Vocês só vão ter que esperar mais um pouco. - Disse Bill.

- Não quero mais ouvir a sua voz. Vai embora daqui.

Bill abaixou a cabeça, e ordenou a saída dos dois ex-militares. Os outros dois estavam lhe esperando acima das escadas.

- Carga entregue. Vamos subir agora e falar com Julian.

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Tardes de sábado são sempre incentivadoras. O dia seguinte é o dia de vagabundear, você pode aproveitar pra fazer o que você bem entender. Era um dia feito para aproveitar. E era tudo isso que Julian estava vendo na varanda de seu escritório. Na praça central, vários cidadãos com roupas leves, contrastando com os ternos e roupas sociais da semana. Rostos alegres e risonhos, e não os rostos arrastados de uma segunda-feira. Famílias reunidas em volta do chafariz, amigos correndo e brincando. Era um cenário bonito. Julian sempre foi um tanto otimista quanto a isso. Imaginava que, quanto mais alegria, menores as chances de se haver alguma revolta. Enquanto a população se diverte, pra que questionar o governo?

Alguém bateu a porta.

- Entre. - Disse, seco, o ditador.

Bill entrou com Francesco no escritório.

- Eles estão na prisão no subsolo - Disse Francesco.

- Perfeito. Perfeito! Você faz jus a sua fama, Bill.

- Perfeitamente, Senhor.

- Já preparei a mala com o restante do dinheiro. Digamos que eu tinha alguma confiança em você. Foi como você disse: um bom investimento para um plano infalível.

- Certamente.

Bill andou até a mesa, pegando a maleta, ao passo que Julian disse:

- Você ainda tem tempo?

- Acredito que sim. Porque?

- Quero lhe contar a história do Henry Grace. Patife escritor. Vi que você se interessou quando o viu na foto. Creio que seja um admirador.

- Li alguns dos seus livros, e o que o lançou na fama: "Coração de Leão". Admirava muito seus livros. Nunca imaginei que ele fosse ser morto por um ditador, apesar disso.

- Como não? Você conhece o governo em que vive, Bill. Aquele maldito tinha contatos no Chafariz, o jornal mais famoso da região! Qualquer coisa que eu fazia, era motivo para ele estimular uma reportagem que afetava completamente a minha imagem. Quantas pessoas eu matei para descobrir que era ele que articulava as idéias! Não sei se reparou, mas todos os seus livros falavam sobre a liberdade. Há! Os homens não sabem usar da liberdade! Se fosse assim, não haveria governo, rapaz. Haveria anarquia! Eu apenas me dou o trabalho de exercer autoridade, colocar os homens nos seus devidos lugares. Diferenças de opinião são os principais motivos de brigas políticas, desorganização interna e guerras! É simples: eu mostro o meu ponto de vista, com seus pontos bons, ruins, e ligo o foda-se! Todos saem ganhando. Algo que os homens tem é a incrível capacidade de adaptação. Não se vê mais revoltas como antes por aqui. Digamos que já aceitam meu governo.

- Não se vêem mais revoltas porque você matou todos, senhor.

- Talvez sim. Mas eles são como cabeças de hidra: mata um, nascem dois. Eu esperava que fosse ser assim. Mas Henry era o foco. Ele disseminava as idéias. Ele era grande amigo do diretor do Jornal, logo várias reportagens que falavam mal de mim eram idéias daquele escritor.  Ele é assumidamente contra a ditadura. Ou melhor, era. Foi difícil chegar a ele. Só depois de torturar quase até a morte o diretor do Jornal foi que pude descobrir que era ele. Dei meus dois primeiros avisos. Mas ele era forte de espírito. Confiava muito no seu povo. A questão é que eu conquistei esse povo primeiro.

Bill não parava de pensar em quão alucinados eram os pensamentos do ditador. Mas já estava com seu dinheiro, era isso que importava.

- Bom, era isso. Poderia te contar mais, mas é como lhe disse: sou um homem ocupado e não gosto de ocupar os outros. Muito obrigado pelos seus serviços. Pode ir agora. Francesco, levo-o até a saída e traga os irmãos para o meu escritório.

- Sim, Senhor! - Disse Francesco.

E, assim, ambos saíram.

Julian virou-se para a varanda novamente. Começou a pensar sobre os momentos de sua vida. O golpe de Estado que lhe deu o poder, o dinheiro que gastou e as pessoas que matou na surdina. Lembrou de Henry Grace, e do dia em que o levou para a prisão no subsolo e o torturou de várias maneiras, até que quando já o havia arrancado dois dedos da mão e alguns dentes, fez o que ele tanto suplicava: um tiro na cabeça.

Haviam se passado cerca de 30 minutos, e nada de Francesco voltar. Julian não ligava, era confiante demais para isso. Poderia ficar ali naquela varanda inteira se convencendo de que ele havia parado para um lanchinho ou estava se divertindo espancando o garoto, deixando ele aquecido para que o ditador pudesse torturá-lo da maneira que ele melhor sabia.

Mais 30 minutos. Nada. Agora estava ficando nervoso. Não de medo, mas de ansiedade. Ele queria muito se divertir com alguém, não fazia isso a algum tempo. Resolveu descer até o subsolo.

Julian estranhou uma coisa: Não havia ninguém no segundo andar. Normalmente, algum segurança ficava ali por perto. Deviam estar na prisão, imaginou. Tomando conta dos dois irmãos. Ou provavelmente almoçando, já que seu relógio marcava 13h. No primeiro andar, perguntou para a sua balconista:

- Aonde está Francesco?

- Ele acabou de descer para a garagem, senhor.

- Tudo bem. Se ele aparecer, diga para ele que vou descer.

A balconista assentiu. Julian se dirigiu a uma porta na parte de trás do balcão. Era um banheiro com dois boxs. Julian entrou no segundo e fechou a porta. Ao puxar a descarga, o chão de baixo do vaso sanitário pulou, como se estivesse se soltado. Julian removeu o vaso junto com o chão e avistou um lance de escadas.

Assim que o desceu, estava dentro da suposta garagem. Era um lugar escuro, até Julian ligou a luz. Viu o carro de Francesco e um dos seus jipes, mas não viu nenhum dos quatro homens. Estava começando a achar estranho. Dirigiu-se até a prisão. Desceu o lance de escadas, até que estava de frente para o portão da cela. A chave estava na fechadura. Tentou girar a maçaneta, mas ela já estava aberta.

- Francesco deve os ter levado para cima. Maldito timing.

Abriu o portão. A cela não estava vazia. Um, dois, três, quatro. Quatro corpos estavam jogados no chão, ensanguentados. Tiros certeiros no peito esquerdo. Reconheceu um deles de cara: Francesco. Estava com o rosto virado para o portão, como se tivesse sido a ultima coisa que viu antes de morrer. Os outros três só podiam ser os outros ex-militares.

 - Mas que porra é essa?

Julian tremeu. Era ditador a anos, matador a mais tempo ainda, e pela primeira vez, ele tremeu de medo. Deu meia volta e subiu correndo as escadas. Quando levantou a cabeça no fim do ultimo degrau, congelou. Não acreditou no que estava vendo.

O jipe estava parado de lado para as escadas da prisão a menos de 5 metros. Encostado na porta, mirando no ditador, estava Bill.

- Bill? Você ficou maluco? Você matou meus homens? No que você estava pensando?

- Negócios, ditador, apenas negócios.

Uma segunda figura saiu de trás do jipe. O ditador o ficou encarando até, após alguns segundos, reconhecê-lo. Não falou nada, estava digerindo a informação. Quando a figura parou do lado de Bill, esse lhe entregou a arma.

Tirar a primeira vida é muito difícil. Na verdade, qualquer coisa que você faça pela primeira vez tende a ser complicada. Você fica nervoso, não tem experiência, se preocupa em fazer o que precisa ser feito da maneira certa. Você não quer vacilar, você não quer errar. Tudo precisa ser perfeito. Mas é impossível você não demonstrar nenhuma emoção, ou não tremer.

Era a primeira vez que Jensen pegava numa arma. E ele a segurava com uma incrível frieza cirúrgica.

- Você deve ser Jensen Grace.

Jensen não falou nada. Continuou mirando o ditador.

- Então, Bill, ele é o que? Seu irmão idiota da loja de móveis? Seu primo? Ou você gostava tanto dos livros do papaizinho dele que resolveu me matar? Oh, desculpe, Jensen. Eu matei seu pai. Buaháháhá.

- Não se atreva a falar do meu pai, seu rato.

- Desculpe, Julian, desculpe mesmo. Mas é como eu digo: negócios são negócios. Ganha quem paga mais.

Julian ficou confuso.

- Bill, - disse Jensen - me faz um favor: Tire Mary do recinto. Prepare o carro. Não quero que ela veja isso. Pode ir depois disso. Já estamos acertados, certo?

Bill assentiu.

- Mary, venha comigo.

Mary saiu de trás do jipe. Ela olhava fixamente para o ditador. Bill abriu a porta do carro de Francesco, entrando no lado do motorista, e Mary ocupou o banco do passageiro. Bill abriu o portão da garagem, posicionando o carro do lado de fora.

- Okay, moleque. Vai me explicar o que está acontecendo?

- 500.000 é um preço muito barato para um ditador pagar, não acha?

Julian tomou um susto.

- É incrível como os assassinos de aluguel funcionam, sabe. Acho que eles são como qualquer comerciante: giram em torno do dinheiro. Quem oferece mais, ganha mais. É simples.

- O que você quer dizer com isso?

- Digamos que eu dei a sorte de procurar o mesmo assassino que você procurou. A diferença é que eu tinha dinheiro pra gastar, idiota. Adivinha porque eu tinha dinheiro? Por sua causa. Você, seu miserável. Você matou meu pai. E ele sabia que você ia matar ele. Mas ele é muito decidido, sabe. Ele sempre luta até o final pelo que ele acredita. E foi assim contra você. Mas você é um animal, um monstro sedento por sangue. O bom é que ele sabia que você era assim. Depositou tudo que tinha num seguro de vida alguns dias antes de você o sequestrar. Dinheiro nunca foi problema. Acho que você não pode dizer o mesmo.

A expressão de Julian era um misto de raiva e impotência.

Jensen continuou: - Gasta tanto com seus guardinhas. A facilidade que Bill os matou foi incrível. Sabe, ele é muito versátil, mas um tanto controlado. Só mata quem precisa e não é covarde. Foi por isso que mesmo sabendo quem eu era, não me matou. Esperou eu acabar de falar e ver que a minha proposta era muito melhor do que a sua.

- Qual foi a sua proposta?

- 500.000 para poupar a minha vida e a de Mary. 50.000 para cada guarda que ele precisasse matar e 300.000 pela sua cabeça. E, de acordo com ele, poderia bolar um plano bom o suficiente para também embolsar os seus 500.000. Dito e feito.

- E você tem 1 milhão para gastar, moleque?

- Para matar um ditador asqueroso como você? Com certeza eu tenho.

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Aquele tinha sido o quarto tiro que Mary havia escutado. A diferença é que foi o primeiro que não a fez chorar.

Esperou apenas 5 minutos para seu irmão entrar no banco da frente. Ele sentou e ficou encarando o nada por algum tempo. Até que olhou para a sua irmã. Ela estava sorrindo.

- Acabou, maninho?

Jensen abriu um sorriso. Uma lágrima escorreu.

- Acabou, sim. Vamos logo pra casa. Precisamos fazer as malas. Estou afim de me mudar daqui.

Jensen ligou o carro. Parou em frente ao portão e olhou para a cabine do guarda. Bill estava olhando para eles. Ao abrir o portão, acenou. Jensen acenou de volta. Fazendo uma leitura labial, Bill viu Mary dizer:

"Obrigado".

2 comentários:

  1. Fueda demais!!!
    Caralho, muito bom mesmo, cara!!
    Parabéns!

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  2. FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA FODA

    FINAL PICA DAS GALÁXIAS!!!!!
    Adorei o conto, man, na boa, muito bom
    Continue escrevendo assim ;)
    Abração

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