quinta-feira, 28 de junho de 2012

Palavras.

A aparência daquela cela só não era pior do que o seu cheiro. Eu estava ali desde de manhã, quando acordei, tonto, após uma marretada na têmpora quando voltava para casa. Só me lembrava de um vulto me atacando. Estava preocupado, mas em choque. Principalmente, porque não estava sozinho na cela. Dormindo, do lado oposto, estava um homem, de aparência similar a minha, mas careca. E com uma cicatriz na bochecha. Queria gritar, mas estava com medo de ser morto pelo dorminhoco bizarro.

Não aguentei. Gritei.

Como de súbito, a figura acordou, deu um salto incrivelmente rápido em minha direção, e tudo que eu pude fazer foi fechar os olhos. Mas... A figura apenas me tapou a boca. Com a outra mão, fez um sinal com o indicador sobre a boca, como se dissesse: "Fique calado". Mas já era tarde. A porta da cela abriu, e dois enormes brutamontes entraram. O homem com a cicatriz chegou para trás, curvou-se, com as mãos cruzadas. Mas não era ele que eles queriam. Olharam de súbito para mim e, quando vi, já estava sendo carregado com um saco na cabeça.

Quando voltei a ver a luz, estava numa sala, sentado numa cadeira, com uma mesa em minha frente. Do outro lado, estava sentado um homem de terno. A luz não chegava em seu rosto, mas ele falou:

"Porque você está aqui?"

Que pergunta era aquela? Em menos de 5 segundos, ele bateu na mesa e perguntou de novo:

"DIGA AGORA PORQUE VOCÊ ESTÁ AQUI!"

"Er... Er... Eu não sei! Eu estava... andando e... acordei..."

"PARA DE GAGUEJAR! SEJA DIRETO!"

"Eu.. eu estava andando e alguém me acertou e eu acordei no chão e...."

"Não estou entendendo nada. Quem te acertou? Fui eu? Que chão? Não sabe falar?"

"Eu não entendo! Eu... Eu caí e, quando vi..."

"CHEGA. Levem-no de volta para a cela."

Antes que eu pudesse ver, tinha tomado um soco na nuca e, quando acordei, estava no chão mal-cheiroso da cela, e a figura com cicatriz estava me olhando.

Demorei um pouco para levantar, até que vi que o homem careca estava tentando se comunicar. Com as mãos. Fazendo sinais.

"Ei, porque você não fala?"

O homem careca fez um novo sinal de silêncio. Percebi que não poderia falar nada naquela cela. Ele me arrastou para o canto da prisão, e com uma pedra, começou a escrever coisas na parede. Pelo estado da mesma, arrisco dizer que ele já teve que fazer isso antes.

"Não. Fale. Aqui."

Okay, isso eu já entendi. Peguei uma pedra e escrevi "Porque?"

Quase morri de susto. Ele abriu a boca. Sua língua estava cortada. Ele escreveu:

"Isso. Não. É. O. Pior".

Ele começou a fazer sinais como se estivesse tirando palavras da sua boca, e entregando a outra pessoa. Eu não consegui entender. Então, ele escreveu:

"Expressão. Comunicação".

Continuei sem entender, e acabei falando:

"Eles querem que eu me comunique? Que eu me expresse?"

Os olhos da figura saltaram. Mandou-me fazer silêncio. Novamente... Tarde demais. Os brutamontes voltaram. A figura, estranhamente, segurou na minha mão. Achei que em um sentido de me dar boa sorte. Foi então, que, antes de me levarem, pude ver a figura desabotoando o peito, e mostrando um buraco aonde deveria ser o coração.

Acho que tenho mais a perder aqui do que a simples fala.

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